Aquele
lugar era surreal, ela até acharia que estava sonhando se não sentisse aquele
frio penetrante enquanto o vento levantava a camisola final e branca do
hospital. Ela ainda estava com a camisola do hospital, mas não havia saído de
lá, um frio ainda mais penetrante percorreu sua alma, algo estava errado. Havia
duas filas, a onde estava era calma, ela procurava alguém conhecido mas nada,
só via alguns velhinhos fofos e alguns de sua idade, tinha até uns adolescentes
e umas crianças. Ela tinha vinte e quatro, uma carreira já promissora, trabalhava
no jornal e finalmente tinha conseguido a sua coluna. Tinha uma boa vida, com
vários bons amigos, uma grande e unida família, um namorado de quem gostava. Ok
que ela não era apaixonada por Jack como ele era por ela, mas como resistir ao
encantador nova-iorquino que conheceu em uma de suas viagens? Ele a fazia
sorrir e era um dos principais incentivadores da sua carreira, ele a amava.
Então por que de vez em quando ela ainda se perguntava por onde andava Eric?
Sua via estava ótima, perfeita e normal, exceto por: O que diabos estava
acontecendo?
Na outra
fila, a que era meio assustadora e inquietante, um grito ecoou enquanto um
homem de terno e com cara de político gritava que tinha dinheiro e podia
comprar qualquer coisa. Uma mulher com um vestido preto grudado ao corpo e
cabelos brancos platinados gigantes pediu espaço entre os caras fortes que
cuidavam das filas – eles pareciam aqueles seguranças de celebridades – ela
flutuou entre todos e segurou o homem de terno irritado enquanto ele a olhava
extasiado, de repente ele gelou e não conseguia mais se mexer. A bela mulher
deu um sorriso tão frio que gelou minha alma. Eu precisava sair daquele lugar.
Foi quando repente o vi. Eric. Ele estava naquela
fila. E parecia são calmo, não calmo, mas sem emoções. Assim que a mulher sumiu e tudo voltou ao normal eu comecei
a sair da minha fila sorrateiramente, precisava falar com ele. Ok que as coisas
não terminaram muito bem entre a gente mas ele era a única pessoa que eu
conhecia naquele lugar. O caminho que eu fiz até ele pareceu passar em câmera
lenta, lembrei-me dos nossos bons momentos e da nossa última conversa, “Você
vai me trocar por esse nova-iorquino? Eu amo você”. Aquilo me doía até hoje. Eu
o amava, uma parte minha sempre o amara e iria amá-lo, ele era meu amigo e o
cara por quem eu tinha sido enlouquecidamente apaixonada, mas nossa relação era
complicada, sempre foi. Eu não queria tê-lo deixado mas não pude mais lidar com
suas atitudes, não pude mais lidar com ele e com como me deixava. Eu precisava
pensar em mim, na minha carreira, na minha felicidade, e foi isso que eu fiz, e
foi ai que Jack surgiu. Depois de uns meses soube que Eric havia se metido em
situações nada boas, eu tentei ajudá-lo, eu fui atrás dele, eu o conhecia, ele
tinha um bom coração, era inteligente, eu via em seus olhos. Mas não naquela
vez. Ele não tinha mais o brilho habitual nos olhos, o hálito fedia a bebida e
a barba mal feita também. Ele estava no fundo do poço e não havia mais nada que
eu podia fazer. Então eu o abandonara. Sempre me diziam “Não há mais nada que
você possa fazer, Alexia. Você precisa ser feliz agora...”. Mas eu era feliz
com ele, pelo menos havia sido. E eu sabia que o abandonara. Acho que uma parte
minha jamais se perdoara.
De repente
eu estava lá de frente pra ele, ele me olhava com uma mistura de surpresa,
tristeza, dor, alegria, amor? Tudo isso junto. “Eric?”, eu disse e ele só me
fitava, até que finalmente respondeu “O que você faz aqui? O que aconteceu com
você?” Comecei a explicar o meu acidente de carro e sobre como em um minuto
estava no hospital e depois acordara naquele lugar estranho. Ele havia ficado
pálido e com uma expressão desesperada. Eu não entendia ou não queria entender.
- Você não
pode ter... Mas o que você faz nessa fila? Tenho certeza que a sua fila não é
essa.
- É, eu
estava na outra, mas vim falar com você. Aliás, acho que você deveria ir para
lá comigo...
- Alexia,
você tem que sair daqui! Volte para a sua fila, vamos!
- Eu não
vou sem você. Sei que você acha que eu não me importo mas eu me importo, Eric!
Não vou te deixar aqui nesse lugar estranho...Dessa vez eu vou te ajudar.
- Não há
mais como me ajudar, Alexia. Eu...você...nós estamos mortos...
De repente
tudo fazia sentido, o lugar, as pessoas, as filas...mas Eric estava mesmo naquela fila? Meu Deus, como eu o havia
abandonado? Eu precisava sair dali, nós precisamos. As coisas não poderiam
acabar assim, precisava de outra chance. Para mim. Para ele. Para nós. Para
quem eu havia deixado.
- Nós vamos
sair daqui, Eric. Eu vou achar um jeito, você terá outra chance e dessa vez eu
vou te ajudar...
- Ok,
senhorita sempre-resolvo-tudo-para-todos. E como exatamente você pretende fazer
com que isso aconteça? Sabe, não é lá a coisa mais simples do mundo.
- Nós ainda
estamos na fila, o que significa que ainda estamos na frase de transição, ainda
temos alguma chance. Sabe como é, li em algum livro sobre algo assim...
- Ah claro,
leu em livros. Quase me esquecera de que você é assim. Mas ok, eu sempre achei
que você era capaz de tudo mesmo. Vamos fazer isso.
E ele me
deu a mão. Fazia tanto tempo que não segurava sua mão, e apesar de toda aquela
situação segurar sua mão ainda era confortante. Eu não sabia bem como
resolveria isso, mas nos acharíamos uma solução. Eu sabia disso e ele também.
Beijo, G.